objetos com história
- pintura -

Pinturas decorativas

A Brasileira do Chiado, Lisboa

Por: Prof. Doutor José Augusto França

Natureza Abstratizada
1971, Manuel Batista (1936)

Uma composição que resume o estado atual de uma démarche pessoal que vem hesitando entre o aprofundamento de uma definição de signos e a exploração das suas consequências decorativas.

Homenagem a Eduardo Viana – Sintra
1971, Fernando de Azevedo (1923-2002)

O quadro de Fernando Azevedo revela maturidade desde o primeiro jato da sua pintura tão meditada e tão trabalhada. Querendo homenagear Eduardo Viana, Azevedo inspirou-se programaticamente num dos seus quadros do café, a Paisagem de Sintra, e entre o espírito e a forma, situou a sua própria pesquisa inventiva, respeitando a estrutura naturalista alheia.

Retrato dos críticos
1971, Nikias Skapinakis (1931-2020)

O caráter-poster das imagens duramente recortadas segundo um desenho propositadamente inábil sujeito a sabidas falências de linha imprime ao quadro um valor imediato. Nikias decidiu retratar os quatro críticos que selecionaram os novos pintores d’A Brasileira num retrato emblemático em que põe em situação um determinado grupo de indivíduos perdidos na sociedade portuguesa.

Forma Abstrata
1971, Marcelino Vespeira (1925-2002)
Uma pintura orgânica e carnal, de um surrealismo absorvido por outras diligências picturiais e que emerge, eroticamente acalmado, num emblema amável. Ligado à sua pintura mais recente, o quadro constitui-se como um corpo ao mesmo tempo imaginado e experimentado com sugestões anatómicas e uma doçura de pele que passa para a tela entre arabescos barrocos.

Cena com figura inspirada numa obra de Marcel Duchamp
1971, António Palolo (1946-2000)
António Palolo foi buscar a uma composição elaborada por Marcel Duchamp o famoso bilhete postal publicitário de «Apolinère Enameled» a inspiração para o seu quadro. A rapariguinha que pinta uma cama no anúncio como que pinta agora os quadros d’A Brasileira, entre árvores de brinquedo e sob um arco-íris anguloso por obrigações de composição e bem colorido por necessidade da paleta gritante.

Café
1971, João Vieira (1934-2009)
João Vieira traça uma hesitação assumida com uma angustiada preocupação que a alegria do material artificial não encobre. A vibração de cores transparentes, que o são e não são, revelam-se um fenómeno específico de luminosidade, que não pode ser considerado secundário na razão de ser da sua obra.

Cena com Arquitetura
1971, Eduardo Nery (1938-2013)
Com Eudardo Nery entramos no domínio da espacialidade definida intelectualmente. Nery, como Calvet, situa a sua composição dentro de um ciclo cultural, embora com graus e profundidades diferentes. Os esquemas de Nery são satisfeitos em arcadas orientadas racionalmente num plano fixo e frontarias de templos que se vão pelos ares, criando um cenário-convite para uma vivência absurda.

Marbella – Apontamentos de Viagens
1971, Joaquim Rodrigo (1912-1997)
A este universo de imagens de propositada ingenuidade, a composição de Joaquim Rodrigo revela um mundo interior transmitido em guisa de comentário ou de diário. Mundo interior e íntimo evocado em memória sensível através dos símbolos cuja ingenuidade não esconde o processo, ele próprio ingénuo, da sua invenção.

Alegoria à Brasileira
1971, Carlos Calvet (1928-2014)
É a metafísica que permite a Calvet desenvolver e explorar uma lógica perfeita no plano de uma sabedoria irónica, aplicando-a ao convite de uma antiga imagem d’A Brasileira: um velho gaiteiro que bebe deliciado um café do Brasil, segurando na mão uma chávena onde se vê o mesmo bebedor pegar noutra chávena que é a mesma e na qual de novo ele pega numa chávena e assim sucessiva e indefinidamente.

Paisagem de Porto Covo
1971, João Hogan (1914-1998)
As sólidas paisagens de João Hogan, ligadas à terra que as inspira com uma força que é de pintura e de terra, tomaram no quadro d’A Brasileira uma feição irreal, como se o pintor tivesse procurado uma saída onírica para as suas imagens quotidianas. LO naturalismo de Hogan vai e vem, mas volta mais rico e com uma capacidade poética que é crítica também, ou auto-crítica, num pintor em plena maturidade.

Pintura Decorativa
1971, Noronha da Costa (1942-2020)
Noronha da Costa embarca numa metafísica romântica com empenhadas distinções. O colorido incerto que os écrans translúcidos sublinham espacialmente confere um jogo de situações ônticas que constitui a notável e original démarche do pintor que se apresenta ao fundo do Café com um ornamento inesperado – o relógio repolhudo que separa dois campos figurativos como sinal pragmático do tempo que ambos negam.